terça-feira, 26 de julho de 2011

PEQUENA TRILOGIA DO OLHAR - PARTE I - SOMENTE PARA OS SEUS OLHOS

Sempre me tocou muito aquela música do Renato Teixeira, Romaria. Sobretudo na parte em que ele se coloca diante da imagem de Cristo e sabe que não precisa dizer nada sobre sua vida, porque o olhar basta.

Isso me levou a um pensamento e a outro, até à seguinte indagação: um olhar efetivamente é capaz de dizer tudo?


Podemos sentir a amizade, o amor, a admiração, a paixão, o tesão em um olhar ou mesmo vários olhares? Olhos nos olhos e está desvelado o querer e o não, as razões da diferença e da anestesia, do amor e do desamor, descrédito, que estamos só no início ou que o inevitável fim se anuncia?


Os olhos espelham o embate do nosso íntimo? Eles nos traem? Traímos com eles?


Tenho me esforçado para olhar nas pupilas dos que estão ao meu lado. Procuro no movimento dos olhos, no olhar que se desvia, sinal de apoio, concordância, censura, admiração, repulsa, sinceridade.


É uma arte de que sou iniciante, pois até a pouco sempre acreditei na palavra.


Essa sim, eu sei: mente, engana, confunde, nada explica, e, mais do que tudo, omite. Entre o pensar e o falar há tempo suficiente para evitar mágoas, ser gentil, politicamente correto, valorar conveniências e consequências, além de não entregar-se.


Há, assim, um hiato, um abismo, um cânion entre o que sentimos e dizemos.


Não sei, mas e se deixássemos as palavras soltas ao sabor da inconsequência da nossa louca paixão, ou da sua retomada, em favor do viver tudo, ou tudo do início, na pelo menos busca da busca da felicidade? Continuaríamos nos perdendo no meio do caminho, nesse limbo, nesse lugar dentro de nós mesmos, esconderijo da falta de coragem, depósito de nosso orgulho, ou moral da aparência, sótão do amor não vivido, do desejo não correspondido, do medo de enfrentar tudo, de dar o o ansiado “start” ou o inexorável “the end”?


Imagino o caos, mas seria um caos necessariamente ruim? Amar de fato quem amamos, detestar quem nos detesta e acarinhar com um sorriso – ou mesmo com um olhar - toda a gente meiga que cruza nosso dia. Cruelmente verdadeiros na palavra ou olhar, tanto faz, seríamos realmente mais infelizes do que somos hoje?


Acho difícil ser pior do que está. Quero crer que, desapegado totalmente da sinceridade da palavra, dita ou escrita, da minha, da tua, mesmo das legendas do filme, me tornei um terrorista do olhar. Está tudo aqui: decepção, revolta, solidão, amor, amizade profunda, vontade de esganar, tudo em duas dimensões, faiscando nos meus olhos sumidos pelas bochechas. Não posso dispensar meus óculos escuros nem à noite. Sem eles estou nu. Meus defeitos e segredos estão por uma fitada breve, totalmente vulnerável que me encontro.


Minha sorte é que ninguém olha em meus olhos (nem de ninguém). Esperam minhas palavras. Ainda bem.


Acho que é por isso, e por tanta coisa que não sei nem explicar, que preciso tanto aprender a decifrar o olhar e a falta dele.


Ou então apenas confortar meu futuro com a poesia do Quintana:




“Quero sempre poder ter um sorriso estampando em meu rosto,
Mesmo quando a situação não for muito alegre...


E que esse meu sorriso consiga transmitir paz
para os que estiverem ao meu redor.


Quero poder fechar meus olhos e imaginar alguém...
E poder ter a absoluta certeza de que esse alguém
também pensa em mim quando fecha os olhos,
que faço falta quando não estou por perto.
Queria ter a certeza de que apesar de minhas
renúncias e loucuras, alguém me valoriza
pelo que sou, não pelo que tenho...
Que me veja como um ser humano completo,
que abusa demais dos bons sentimentos
que a vida proporciona,
que dê valor ao que realmente importa,
que é meu sentimento...e não brinque com ele."




E como disse certa feita o velhinho: “O pior de nossos problemas é que ninguém tem nada a ver com isso”.







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