terça-feira, 26 de julho de 2011

PEQUENA TRILOGIA DO OLHAR - PARTE II - DE OLHOS BEM FECHADOS





Hoje não podemos nos dar ao luxo de sentir, muito menos de eternizar O SENTIR no papel ou com o teclado.




Tem pressão social para que não assumamos nossos sentimentos bons e ruins, notadamente o amor. E inimaginável curtir uma fossa pública.




Credo postar no “face” ou no tweeter estar apaixonado, amando, voltando a amar o marido ou a mulher com todo o entusiasmo. Falar disso, mesmo entre amigos, nem pensar.




É regra do jogo: jamais fale "eu te amo", a não ser da boca pra fora. Quando ama-se mesmo, de verdade, não se diz. Quando o ente amado sabe que é amado, cria halos e abusa, deita e rola. Não é assim que se comenta?




Somos por isso instigados a acreditar que esconder de todos, de nós mesmos, é sinal de fortaleza.




É corrente que devemos manter o amor em mistério, que brincar de gangorra é que faz que com que a abençoada ou o abençoado corresponda e possa existir uma mínima chance de viver a paixão ou que dure.




Gostamos de intrincadas tramas, de idas e vindas, dificuldades adicionais, como se as inerentes às diferenças entre duas pessoas não bastassem.




Há uma crença disseminada (quiçá pelos livros do Sidney Sheldon) que o amor é tanto melhor se é impossível, que não possa existir de fato senão na remota possibilidade de vivê-lo. Talvez o amor eterno seja somente eterno assim, se eternamente ficarmos pensando se teria dado certo ou não. Se viver, estraga.




Há perguntas, de outro lado, que não devemos nem internamente nos fazer. Nunca questione quem amas de modo a que desmorone o que tu querias acreditar que existisse e que a razão da existência te servisse como afirmação de que alguém te vê simply the best, como a música na voz da Tina Turner. Em nenhuma hipótese pergunte se és amado. Soa carente, desesperado.




Nestes tempos do eu, quem é que se arrisca a amar desbragadamente, como se no mundo não existisse ninguém que chegasse aos pés.




Amor próprio, amor próprio, rapaz, gosta primeiro de ti, gosta sobretudo de ti, mais de ti, é que nossos amigos nos dizem. Quem nos diz: “ vai, te atira, mergulha de cabeça”? Ao contrário, aconselhamos, as vezes invejosamente, calma, parcimônia, pé atrás, os dois se possível.




É sinal de fraqueza, de falta de confiança, de dependência, de amar a si, amar outrem desmedidamente.




Amor, aliás, tem forma, medida. Não pode ser de menos, senão acaba, ou de mais, sob pena de asfixia. Não está longe assim de virar produto, vendido em farmácias e lojas de conveniência, em drágeas, flaconete, long neck e litrão.




Tem dias, horários e condições também. Depois das crianças dormirem, mas não antes da manicure ou logo em seguida da aula de dança, toda suada.




Menos que duas vezes por semana é sinal que as coisas vão mal. Mensal é o fim. Todo dia é coisa para coelhos.




É aplicável, para calcular a dose certa, uma equação. Segue a fórmula: AC (amor no casamento)= IA (início apaixonado) + NER2 (Não embarangação recíproca) – (NDR [necessidade de discutir a relação frequentemente] – DFAC [desculpa dos filhos atrapalharem a relação]) + JTCT (jamais ter cedido a tentação) /TC (tempo de casamento).




Chega-se, então, ao IAC (Índice de Amor no Casamento). Mensalmente o índice é tabelado pelas revistas Nova, Carícia, Marie Claire, que podem classificar o RC (risco casamento), conforme o resultado da equação anterior.




Encontre o seu e consulte a tabela.




Que dias esses, ou, como diz o Milton Leite: " Que faaaase, que faaaase".




Foi-se o tempo de amar. O tu, no caso eu ou tu ( que não seja ele ou ela), não tem mais vez.




Prefere-se fartar de si mesmo do que se fartar de alguém, mesmo que todo mundo esteja ou tenha estado ou deveria estar atrás de alguém ou de algo que só alguém poderia acrescentar.




Amor que é amor, não vê imperfeições. Mas hoje, para usar uma metáfora, ninguém mais beija de olho fechado.




Preferimos beijar de olho aberto para ver se a(o) beijada(o) não está também de olho aberto e a(o) beijada(o) está de olho aberto para se certificar de que nós, no caso eu ou tu, que está agora lendo essa bobagem, deixamos de cerrar as pálpebras.




Como todo mundo quer ser antes amado, sintoma do egoísmo sentimental desta era, ninguém ama minguém.




Mas fica aqui minha frase para a próxima Nova: “ninguém ama ou é amado quando beija de olhos abertos”.

Um comentário:

  1. Burk, é a Silvia - entrei com a conta do Giovani (ele é que possui todas as contas da minha vida, eu odeio contas, rsrsrs) amei a sua fórmula para apurar o ICS (índice do casamento satisfatório)... vou colocar no papel pra ver como andamos... penso que bem, embora não seja mensal nem diário, mas é sempre bom conferir - afinal, não sou adepta da leitura dos manuais femininos que fornecem os índices "socialmente aceitos"...

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