terça-feira, 27 de abril de 2010

E na ANAMATRA também

Fosfosol na ANAMATRA também.



"29/05/2005 às 00:00:00 - Atualizado em 19/07/2008 às 15:58:39

O quinto constitucional deve ser extinto

Jornalista Externo

Dando cumprimento ao deliberado pela esmagadora maioria de juízes do trabalho, a Anamatra entrega ao Congresso Nacional nos próximos dias sugestão de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que elimina o denominado quinto constitucional nos tribunais brasileiros, de segunda instância e superiores. Com a medida, o ingresso na carreira da magistratura se fará apenas por meio do concurso público, valorizando, assim, o princípio da igualdade de oportunidades e consagrando a plena democratização no acesso aos cargos do Poder Judiciário.
É evidente que órgãos corporativos esperneiam, gritam e ameaçam com represálias, como se a Anamatra e os seus dirigentes não estivessem acostumados a confrontos de intensidade bem mais significativa do que a luta contra o quinto constitucional. Façamos, no entanto, um debate sobre o assunto ou a realização de muitos encontros civilizados que possam discutir a raiz do problema. Mas parece que essa alternativa não é interessante para os que perseguem a manutenção do instituto a qualquer cust o custo da desinformação.
O quinto é uma aberração, que, infelizmente, tem amparo constitucional.
Qual o caminho?
Evidentemente, é extirpá-lo de nossa Carta, através do embate político (em sentido lato), demonstrando que essa forma de ingresso na magistratura não mais se justifica. E pode demorar, mas vamos consegui-lo.
Da mesma forma que o fizemos no caso de outra “representação” classista. Não foi a Anamatra quem deliberou pela luta por sua extinção. Foi a imensa maioria dos magistrados trabalhistas. A associação apenas canaliza o que é vontade da ampla maioria de seus associados.
Por certo, nessa luta serão absolutamente respeitados, que esses sim são intangíveis, os direitos adquiridos dos advogados-juízes e dos procuradores-juízes que, legitimamente, segundo a ordem constitucional vigente, por méritos técnico-políticos ou apenas políticos, ingressaram na magistratura. Na verdade, queremos que também esses colegas, convencidos da razoabilidade e justiça de nossa luta, a ela adiram. Não há nenhum
demérito ou contradição em que adotem essa orientação.
Assim como não há de se atribuir, generalizadamente, nenhum demérito a colegas que tenham, legitimamente, ingressado pelo quinto, quando é certo que muitos deverão efetivamente estar qualificados para o mister jurisdicional e o estarão demonstrando.
A luta não é contra os colegas do quinto, mas sim contra o instituto do quinto. Não há nesse embate, ademais, nenhuma desconsideração para com a nobre classe dos advogados. Na verdade, ocorre exatamente o contrário. Afinal, a quase totalidade dos magistrados tem origem na advocacia (sendo alguns poucos, como não poderia deixar de ser, apenas bacharéis em direito).
Muitos com largo tempo de atuação nessa atividade essencial à Justiça. É exatamente por isso, aliás, que não se justifica a “representação” nos tribunais por “outros advogados”, cuja única diferença é não terem sido aprovados no mais democrático dos mecanismos de acesso, que é o do concurso público.
De outro lado, quando advogados ou procuradores ingressam nos Tribunais, automaticamente transformam-se em juízes, com idênticos direitos, garantias e deveres. Assim, não há propriamente uma “representação” da advocacia ou do Ministério Público, de que apenas se poderia cogitar caso fosse estabelecido mandato, ou seja, transitoriedade na função, com a perspectiva de substituição de quem não represente adequadamente a instituição representada.
Afinal, é ínsita à idéia de representação a da possibilidade do representado extinguir o mandato concedido, o que não ocorre na espécie. Transformando-se em juízes vitalícios, os ungidos pelo quinto logo haverão de “perder o oxigênio”, que, segundo seus defensores, é o que alimenta o instituto.
Com efeito, o argumento que se ouve em defesa do instituto do quinto é o da “oxigenação” do Judiciário, do que se extrai, por lógica elementar, que juízes não teriam capacidade de oxigenação. Se é esse o problema, deveríamos começar ou incrementar o plantio de árvores nas Cortes.
É que, a ser verdadeiro tal raciocínio, é de se convir que, quando os advogados oriundos do quinto se transformam em juízes, terão também que perder (em algum momento, não muito demorado) a capacidade de oxigenação. A menos que se entenda que sejam “sulfurosos” (ou “carbônicos”) apenas os advogados que se convertem em juízes mediante concurso público. O que, convenhamos, não é razoável.
Na verdade, um debate sério haverá de levar a própria OAB a concluir que o mecanismo do quinto é discriminatório aos próprios advogados, na medida em que atua em detrimento daqueles seus associados que optem por trilhar a carreira da magistratura submetendo-se a um filtro que, indiscutivelmente, afere o saber jurídico do candidato (ainda que não seja ele notório).
A reforma do Poder Judiciário recentemente promulgada por meio da Emenda Constitucional nº 45/04, sem nenhuma dúvida, solapou o último argumento que dava alguma consistência teórica ao denominado quinto constitucional. Alegava-se, antes da alteração na Carta Política, que o ingresso de advogados e de membros do MP implicava na existência de algum controle no Poder Judiciário, realizado por quem era detentor de autoridade para tanto (OAB e órgãos do MP).
Pois bem. O Conselho Nacional de Justiça foi criado exatamente para desempenhar a tarefa de fiscalização do Poder Judiciário, com a participação da OAB e do MP de maneira expressiva, pois dos seus quinze integrantes, seis podem ser oriundos da advocacia e do Ministério Público. Ademais, qualquer candidato a cargo da magistratura deve ter no, mínimo, três anos de atividade jurídica, quase sempre relacionada ao exercício da função de advogado, a partir das novas disposições constitucionais.
Existe razão para a manutenção do quinto, agora, considerando que duas das principais bandeiras da advocacia foram contempladas na EC n.º 45/04?
Nenhuma. Apenas o desejo de continuar com o poder político.
Aliás, não se poderá negar que, especialmente nos últimos anos, juristas de reconhecimento nacional não têm aceitado sequer a candidatura ao cargo de juiz pela via do quinto constitucional. Com efeito, a má remuneração dos magistrados e as limitações impostas à aposentadoria precoce acabaram por afastar qualquer interesse dos advogados que, já bem sucedidos (quando efetivamente notório seu saber jurídico) ou quando sintam-se aptos a sê-lo, optam, invariavelmente, por permanecer em seus escritórios, no exercício da nobre profissão liberal.
Nesses casos, regra geral, apenas haveria interesse se possível a preservação da atividade privada paralelamente à magistratura. Afinal, a poucos atrai, sobretudo nos dias de hoje, “queimar dinheiro”. Entretanto, diante da expressa vedação constitucional (já que ao magistrado apenas se permite, paralelamente, um cargo de magistério), a ninguém animará tal alternativa, que apenas se viabilizaria mediante artifícios fraudulentos.
Sob essas perspectivas, conquanto não seja defendida (pois aqui também entraria o jogo da política em sentido estrito), seria uma solução muito mais razoável que a lista dos concorrentes ao quinto fosse escolhida pela OAB e MP a partir do rol de magistrados que, na judicatura, por longos anos, “comeram poeira”, de sorte que essas instituições pudessem identificar aqueles que, a seu juízo, fossem portadores de uma maior dose de oxigênio ou de capacidade de fotossíntese.
A propósito, muito mais injustificável ainda é o acesso aos tribunais, pelo quinto, dos integrantes do Ministério Público. Tais “representantes”, a despeito de terem seu saber jurídico aferido também pelo mecanismo do concurso, optaram por uma carreira do serviço público tão nobre quanto a da magistratura, não havendo nenhum sentido em se converterem em juízes sem passar pelo concurso específico, alçando à carreira da magistratura, per saltum, diretamente aos tribunais.
O argumento em relação a eles já não seria o da “oxigenação” (posto que concurso seria sinônimo de “sulforação” ou “carbonização”), mas sim o da fiscalização. Ora, todos sabem que os colegas egressos do quinto convertem-se em juízes como todos os outros, e não “fiscalizam” mais que os outros a atuação escorreita da categoria que passam a integrar. Aliás, fiscalização de si próprio é uma contradição em termos.
Na verdade, a atividade do Ministério Público como fiscal da lei (custos legis), nos tribunais, lhe é plenamente assegurada (e exercida) pelo assento que lhe é garantido em todas as Cortes, independentemente do quinto. Nada justifica a participação de seus integrantes, como magistrados - que, em nosso sistema, originariamente não o são - nos tribunais, servindo o mecanismo do quinto, no mais das vezes, apenas como instrumento para “cortar caminho” na carreira.
A carreira do MP, mercê de uma forte atuação política, ao menos no âmbito da União, conseguiu cumular todas as poucas vantagens e garantias dos magistrados, além das inerentes aos servidores (que, ao menos no tocante às vantagens remuneratórias, segundo o STF, não se estendem aos magistrados), de sorte que atualmente, em muitas situações, têm sido encontradas dificuldades para o preenchimento das vagas do quinto destinadas aos integrantes do Parquet. Houve, sabidamente, Tribunais Regionais do Trabalho que ficaram diversos anos com a vaga desocupada por falta de interessados.
De outro lado, concretamente, gozam de uma independência até maior que a da magistratura, enquanto essa sujeita-se a inúmeras “fiscalizações”, uma delas exercida pelo próprio MP (que ela, a seu turno, não fiscaliza), além das desempenhadas pelos jurisdicionados e pelos advogados (a que, em regra, não está sujeito o MP). A rigor, tudo isso levou a que, atualmente, os advogados ou bacharéis estejam a preferir, já de início, a carreira do Ministério Público à da Magistratura, algo pouco comum em período não muito distante.
Embora queiramos contar com o apoio dos colegas oriundos do quinto, em reconhecimento à pertinência, razoabilidade e justiça de nossa luta, não nos furtaremos ao embate com aqueles que pensam diversamente. Não nos constrangerão ameaças, veladas ou expressas, com que se queira limitar a livre manifestação de nossas idéias. Houve patrulhamentos semelhantes quando pugnávamos pela extinção da outra representação classista, ao tempo em que ela, mercê de sua desenvoltura política, determinava quais os grupos detentores do poder nos tribunais trabalhistas.
Embora as ameaças também fossem constantes àquela época, a coragem de muitos colegas, não se furtando ao enfrentamento, galvanizou toda a magistratura, levando aos resultados que todos conhecemos. Como antes, também agora, não surtirão efeito, não inibirão nossa luta.
Na verdade, hoje não temos que combater apenas o quinto. Já se escreveu que o que era quinto, transformou-se em quarto, depois em terço, em seguida em metade e, se não reagirmos, chegará ao todo.
Com efeito, a possibilidade dos oriundos do quinto nos Tribunais de Alçada concorrerem em vagas da magistratura nos TJs levou a que, nessas Cortes, se atingisse, e até mesmo se ultrapassasse, o quarto. Depois, estabeleceu-se o terço na composição do STJ, que, pela possibilidade de acesso às vagas da carreira por parte de oriundos do quinto nos TJs e TRFs, já levou a que ocupem a metade das vagas naquela Corte. Por fim, no STF, hoje, salvo engano, apenas dois dos integrantes seriam genuinamente oriundos da carreira da magistratura.
Maiakowski explica (lembremo-nos do caso das rosas de nosso jardim). Tudo isso é reflexo do forte trânsito e capacidade de articulação política que caracteriza os oriundos do quinto, que se revela no próprio fato de virem a ser os ungidos por essa alternativa. De outro lado, também é decorrência da fragilidade da organização associativa da magistratura de carreira, que, apenas nos anos mais recentes, acuada, passou a se articular mais adequadamente.
A continuar como estão as coisas, chegaríamos ao paradoxo de não termos magistrados de carreira nas cúpulas dos nossos Tribunais. É tarde, mas ainda não passou a hora de se iniciar a reação. Mesmo que seja vagarosamente (por conta dos direitos adquiridos, que devem ser respeitados e preservados), haveremos de reverter esse estado de coisas: de quase zero, para metade; da metade, para o terço; do terço, para o quarto; do quarto, para o quinto; e do quinto, para o ZERO, apenas ressalvada razoável participação de outros segmentos no STF, dada sua especial qualidade de Corte Constitucional e, como tal, essencialmente política.
Não se pode conceber que as demais Cortes, fundamentalmente técnicas, sejam fortemente contaminadas por composições majoritárias definidas a partir de atuação política (em seu sentido estrito). Mesmo porque é desigual o embate, mormente quando se considera a vedação constitucional, em relação aos magistrados, à atuação político-partidária, que, ao cabo, efetivamente, é a que define essas disputas.
Vivas a uma OAB, dos advogados, forte, vigilante e atuante.Vivas a um MP forte, dos companheiros que a ele chegam apenas por concurso e, orgulhosos da instituição a que pertencem, não abram mão de nela permanecer. Vivas a um Judiciário forte, apenas integrado por juízes que a ele acorram por concurso e comam a poeira da longa e dura estrada própria da judicatura".
Grijalbo F. Coutinho e Rodnei Doreto Rodrigues, respectivamente presidente e diretor de Prerrogativas e Direitos da Anamatra.

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